ATENDIMENTO AO CIDADÃO

MPPA requer e Justiça bloqueia R$ 105 milhões de donos de aterro

Dinheiro servirá como garantia para implantar medidas de tratamento do passivo ambiental no local
Marituba 27/05/19 20:17

Em resposta a um pedido feito pelo Ministério Público do Estado do Pará (MPPA), o juiz Daniel Bezerra Montenegro Girão, da 1ª vara cível e empresarial de Marituba, determinou o bloqueio de R$ 105.028.940,00 (cento e cinco milhões, vinte e oito mil, novecentos e quarenta reais) das empresas responsáveis pelo aterro sanitário instalado no município de Marituba. As donas do empreendimento anunciaram que a partir do próximo dia 31 de maio o local não receberá mais resíduos gerados em Belém, Ananindeua e Marituba.

O bloqueio de valores atinge as empresas Guamá Tratamento de Resíduos Ltda., Revita Engenharia S/A, Vega Valorização de Resíduos S/A e Solvi Participações S/A, responsáveis pelo aterro sanitário. A Justiça também determinou que elas providenciem o tratamento de todo o passivo ambiental existente no empreendimento, especialmente o chorume e o gás tóxico emanado pelos resíduos.

Em entrevista coletiva concedida na tarde desta segunda-feira (27), no auditório da Promotoria de Justiça da Infância e Juventude, em Belém, membros do MPPA explicaram que o pedido de bloqueio dos valores das empresas busca resguardar os direitos da população da região metropolitana de Belém e garantir recursos para implementar as medidas necessárias ao tratamento efetivo dos resíduos depositados no aterro sanitário.

Veja a galeria de fotos da entrevista coletiva sobre a decisão judicial

Membros do MPPA e técnicos da Fadesp durante entrevista coletiva
Membros do MPPA e técnicos da Fadesp durante entrevista coletiva
Foto: Alexandre Pacheco

Com os R$ 105 milhões bloqueados, as empresas deverão destinar, em caráter de urgência, R$ 95,5 milhões somente para o tratamento do passivo de chorume. Já a implantação eficiente de captação e tratamento de gases deve consumir R$ 6 milhões. A construção de barreiras de contenção ao redor do maciço de resíduos e a cobertura do mesmo está programada para custar cerca de R$ 3,5 milhões. O valor bloqueado ficará sob custódia da Justiça.

O MPPA requereu e a Justiça também determinou que as empresas paguem R$ 5 milhões pelo descumprimento de um termo de ajustamento de conduta (TAC), firmado em 2018 com o Ministério Público, que tinha o propósito de adequar a operação do aterro sanitário à legislação ambiental.

Motivação

A decisão judicial foi expedida no último dia 24 de maio e foi motivada por pedidos feitos, no âmbito de uma ação civil pública ajuizada previamente pelo MPPA, pelas promotoras de Justiça Ana Maria Magalhães e Marcela Melo, que atuam conjuntamente na Promotoria de Justiça de Defesa do Consumidor, do Meio Ambiente, do Patrimônio Cultural, da Habitação e do Urbanismo de Marituba.

O MPPA constatou que as empresas descumpriram vários itens do termo de ajustamento de conduta (TAC) firmado em 2018, como a falta de implementação de mecanismos para o tratamento adequado do chorume e da emissão de gases. Um dos compromissos era a aquisição de novos equipamentos para realizar a osmose reversa (tecnologia para tratamento do chorume), o que não foi cumprido. O empreendimento só tem capacidade para tratar 880 m³ de chorume por dia, ocasionado assim, déficit de 240 m³/dia para realizar o tratamento do lixiviado existente no aterro.

As promotoras de Justiça levaram em consideração relatórios técnicos elaborados por pesquisadores da Fadesp (Fundação de Amparo de Desenvolvimento de Pesquisa), contratada para fazer estudos sobre o tratamento de resíduos sólidos e realizar o acompanhamento dos trabalhos de adequação da operação do aterro sanitário. O principal problema identificado pelos técnicos da entidade foi o tratamento do chorume.

“O chorume no aterro aumentou, ao invés de diminuir, como tinha que ocorrer. Os equipamentos da empresa não estavam funcionando a contento para tratar o chorume. Isso é algo muito grave. A quantidade desse resíduo existente no aterro é capaz de encher cerca de 80 piscinas olímpicas, um chorume que não está sendo tratado adequadamente”, comentou a promotora de Justiça Marcela Melo.

Lagoas que armazenam chorume dentro do aterro: tratamento inadequado
Lagoas que armazenam chorume dentro do aterro: tratamento inadequado
Foto: Divulgação

A promotora de Justiça destacou que as falhas na operação do empreendimento já produziram vários impactos negativos na rotina da população de Marituba, como o aumento significativo da procura por atendimento médico nas unidades de saúde do município. A maioria dos pacientes reclama de problemas respiratórios, supostamente provocados pelos gases emanados pelo aterro.

Promotora de Justiça Marcela Melo detalha providências do MPPA
Promotora de Justiça Marcela Melo detalha providências do MPPA
Foto: Alexandre Pacheco

"A empresa anunciou em novembro de 2018 que encerraria as atividades. De lá para cá nem apresentou à Secretaria de Meio Ambiente um plano para fechamento do aterro. São vários problemas na conduta dos responsáveis pelo aterro", alertou Marcela Melo.

Destinação dos resíduos

O promotor de Justiça José Godofredo Pires, coordenador do Centro de Apoio Operacional do Meio Ambiente do MPPA, também participou da entrevista coletiva desta segunda-feira e explicou que a decisão judicial expedida não está diretamente relacionada ao encerramento das atividades de recebimento de resíduos no aterro de Marituba, previsto para a próxima sexta-feira (31). Contudo, ele aproveitou o encontro com os jornalistas para esclarecer o papel do Ministério Público no caso.

“A destinação dos resíduos é uma responsabilidade dos gestores, especificamente dos prefeitos. O Ministério Público fiscaliza os atos dos entes públicos e o cumprimento da política nacional dos resíduos sólidos”, explicou. "O impasse que ocorre no momento é de ordem econômica, é de dinheiro. A empresa quer receber um valor que as prefeituras não querem pagar. O Ministério Público não senta nesta mesa de negociações", reforçou.

A Guamá Tratamento de Resíduos, responsável pela operação do aterro, alegou restrições técnicas e econômicas para continuar recebendo os resíduos. A empresa recebe R$ 65 das prefeituras de Belém e Ananindeua para cada tonelada de resíduo depositada no aterro. Marituba, por ser sede do aterro, é isenta do pagamento. A empresa já propôs que o valor seja reajustado para R$ 114 por tonelada. Os gestores municipais não concordam em pagar este preço. O Governo do Estado participa das negociações para resolver o impasse, mas ainda não há uma solução.

Resíduos descobertos armazenados dentro do aterro sanitário em Marituba
Resíduos descobertos armazenados dentro do aterro sanitário em Marituba
Foto: Divulgação

O promotor de Justiça José Godofredo Pires destacou que “os gestores têm que saber que o não cumprimento da lei envolve responsabilidades cíveis e criminais de cada prefeito. Cabe ao município dar a solução à destinação dos resíduos. Se não deu, vai responder pelos seus atos”.

30 quilômetros de lixo

Pesquisadores da Fadesp presentes à entrevista coletiva desta segunda-feira no MPPA reforçaram que existem, sim, alternativas técnicas para o aterro continuar recebendo resíduos. Uma solução possível é promover o alteamento da célula atual onde é depositado diariamente o resíduo. Esta alternativa daria uma vida útil de pouco mais de seis meses ao empreendimento, tempo considerado suficiente para a preparação de outras áreas para receber os resíduos.

A empresa já se posicionou afirmando que não executou o alteamento por não ter recebido autorização da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas).

“Se nada for feito, em um mês sem local para depositar o resíduo, Belém terá mais de 30 quilômetros de lixo nas ruas, sendo muito material orgânico em putrefação, que provoca cheiros insuportáveis e doenças. O preço de tratar isso torna irrisório o valor cobrado pela empresa para receber o resíduo no aterro”, disse o pesquisador Mário Russo, da Fadesp.

Pesquisador Mário Russo, da Fadesp: Belém pode ficar com 30 km de lixo nas ruas
Pesquisador Mário Russo, da Fadesp: Belém pode ficar com 30 km de lixo nas ruas
Foto: Alexandre Pacheco

Histórico

Esta não é a primeira vez que o MPPA obtém decisões judiciais favoráveis em relação ao aterro sanitário de Marituba. Desde 2017, o Ministério Público já ajuizou uma ação civil pública e quatro denúncias criminais envolvendo as empresas e seus executivos.

A atuação do MPPA já resultou previamente no bloqueio de R$ 18 milhões das contas das proprietárias do empreendimento, recurso utilizado para investimentos na adequação do aterro. Além disso, as denúncias criminais resultaram em prisões de diretores das empresas.

O MPPA também firmou um TAC com as empresas, mas o mesmo não foi cumprido como deveria, o que motivou novos pedidos na esfera judicial.

  

Texto: Fernando Alves
Assessoria de Comunicação Social

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