Audiência pública debate criação de comitê para Bacia do Tapajós
Foi realizada no último dia 12, no auditório das Promotorias de Justiça de Santarém, audiência pública para debater a implementação de um Comitê Gestor para a bacia do Tapajós, afluente da margem direita do rio Amazonas. O evento, promovido pelo Ministério Público Federal (MPF) e Ministério Público do Pará (MPPA), contou com a participação de movimentos sociais, lideranças de comunidades ribeirinhas, indígenas e quilombolas, pesquisadores, organizações da sociedade civil e poder público. A partir das informações coletadas, o objetivo é obter uma gestão descentralizada e sustentável dos recursos hídricos da região, com a garantia de participação ativa das comunidades do oeste do Pará.
Na abertura, a Procuradora da República Thais Medeiros Costa destacou a iniciativa de ouvir a população interessada, uma vez que “o rio Tapajós é mais do que um recurso hídrico, ele é um rio de vida, ele dá existência para as pessoas, existência para os grupos, e a sua grandiosidade também atrai, é um ímã para interesse de outros”.
A promotora de Justiça Lílian Braga, titular da 13ª Promotoria de Justiça do Meio Ambiente de Santarém, falou sobre a necessidade de planejamento e organização das ações. “Penso que o comitê pode nos ajudar nesse planejamento, nesse diálogo, para que a gente não pegue os problemas quando eles já estão lá na frente acontecendo, e a gente não consegue mais fazer nada, ou muito pouco se pode fazer”, disse a promotora.
O procurador da República Vitor Vieira Alves, em participação virtual, lembrou de casos de atuação do MPF relacionados ao Tapajós, a exemplo do porto da Cargill, nos anos 2000, que resultou na apresentação do estudo de impactos ambientais conforme exigido na Constituição, sendo um importante precedente para todo o Brasil. Outro caso foi o porto da Embraps, em 2016, em razão da ausência de consulta a indígenas, quilombolas e pescadores artesanais, do Lago Maicá, em Santarém. “Percebemos ao longo desses dois anos, que as decisões têm sido tomadas de cima para baixo, principalmente oriundas do setor econômico, sem considerar o aspecto espiritual e simbólico do rio para as populações”, ressaltou o Procurador.
A procuradora da República Thais Medeiros apresentou as motivações que levaram o Ministério Público a convocar a audiência pública, informando que em 2023 começaram a lidar com a grave escassez hídrica que vem atingindo o rio. “2023 e 2024 foram os anos de pior escassez hídrica na história do rio Tapajós e foram seguidos, o que demonstra o impacto da crise climática”.
Demonstrou também o despreparo das instituições públicas em lidar com a crise, sendo recomendado à época a instalação de um comitê para adoção de medidas de emergência e humanitárias. Citou ainda a atuação diante do garimpo ilegal em terras indígenas, a contaminação por mercúrio, a atividade portuária e a instalação de hidroelétricas. “O rio Tapajós é um berço de grandes empreendimentos que sequer passam pelo crivo da comunidade que vive nesse rio”, concluiu.
A audiência foi acompanhada virtualmente pela representante da Agência Nacional de Águas (ANA), Flávia Simões, que ressaltou a atuação dos comitês de bacia, sendo esse o primeiro passo, mas principalmente deve ser garantida a participação dos atores interessados. Ela sugeriu um encontro para falar sobre a dinâmica de funcionamento dos comitês. “Na bacia do Tapajós, já existem três comitês matogrossenses em funcionamento e seria interessante entender e ouvir essas experiência”, sugeriu.
Manifestações e encaminhamentos
Cerca de 40 participantes se manifestaram sobre as diversas questões e problemas relacionados à vivência na bacia do Tapajós. O representante do movimento Tapajós Vivo, padre Edilberto Sena, leu e entregou uma carta ao MPF e MPPA, com sugestões e proposições de encaminhamentos para a audiência pública. A carta citou as pressões e impactos socioambientais decorrentes dos empreendimentos que se instalam na região, que intensificam os conflitos pelo uso da água e colocam em risco a segurança hídrica das atuais e futuras gerações dos povos indígenas, comunidades tradicionais, pescadores e populações urbanas, por isso a importância de um comitê de bacia hidrográfica, para definir estratégias de mobilização que assegurem a participação efetiva da sociedade civil.
O vereador de Santarém, Biga Kalarare, enfatizou a atuação preventiva das instituições para a proteção do rio. “Infelizmente nós, enquanto agentes municipais, não temos autonomia. O que a gente pode fazer são leis que visem cobrar custeio por danos, só que ela vai atuar após o acontecimento, então eu acho que a gente precisa de leis que previnam”, disse.
A representante da Associação das Mulheres Munduruku- Wakaborûn, Maria Leusa, lembrou que a audiência trata da vida de todos que vivem na região. Ela solicitou que seja garantida a participação das comunidades do Tapajós na discussão. “Hoje não é só o garimpo que traz os impactos para o nosso povo Munduruku. Sabemos que tem vários empreendimentos para privatizar o nosso rio. Lembro que existem nossos locais sagrados que estão sendo violados e destruídos. A nossa mãe, o rio onde a gente vive”.
Um dos objetivos da audiência foi articular a formação do Comitê Gestor, conforme previsto na Resolução do Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH) nº 5/2000. Nesse sentido, as deliberações finais foram para que seja oficiado à Agência Nacional de Águas (ANA) e Secretaria Estadual de Meio Ambiente, para que articulem conjuntamente a realização de oficinas informativas em vários pontos do oeste do Pará, com calendário e cronograma informado ao Ministério Público, garantindo desse modo a representatividade do comitê gestor. Será requisitado também a composição de um grupo técnico para realizar estudos socioambientais sobre os recursos hídricos do Tapajós, apontando as áreas críticas em termos de poluição, insegurança hídrica e impactos sobre as populações locais.
Assessoria de Comunicação